sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

A Conivência com o Mundo

Nasci dura, heroica, solitária e em pé. E encontrei meu contraponto na paisagem sem pitoresco e sem beleza. A feiura é o meu estandarte de guerra. Eu amo o feio com um amor de igual para igual. E desafio a morte. Eu – eu sou a minha própria morte. E ninguém vai mais longe. O que há de bárbaro em mim procura o bárbaro e cruel fora de mim. Vejo em claros e escuros os rostos das pessoas que vacilam às chamas da fogueira. Sou uma árvore que arde com duro prazer. Só uma doçura me possui: a conivênci
a com o mundo. Eu amo a minha cruz, a que doloridamente carrego. É o mínimo que posso fazer de minha vida: aceitar comiseravelmente o sacrifício da noite. 

Clarice Lispector, in 'Água Viva' 

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